terça-feira, 13 de dezembro de 2011

DIÁRIO DE BORDO: MACHU PICHU

Estávamos todos naquele trem, a surpreendente viagem de três dias entre os limiares dos Andes até a cidade pré-histórica de Machu Pichu havia sido desgastante, porém magnífica. Havíamos passados três dias de caminhada no coração das montanhas atravessando florestas, bosques e regiões secas também chamadas de estepes. Ao longo desse trajeto avistamos diversos sítios arqueológicos com diferentes funções dentro da sociedade Inca. Com certeza em meu coração algo dizia que tudo isso que havíamos visto e compreendido era apenas um aperitivo para o que viria a ver no final dessa longa caminhada – A cidade perdida por séculos de Machu Pichu.

LEMBRANÇAS EM UM TREM
Lembro-me ainda daquele momento no trem, a Isis e o Mago estavam sentados juntos em um banco do vagão e logo a sua frente estavam João Paulo e Luis Otavio. Jogavam baralho como crianças fazendo do trajeto Águas Calhentes-Ollantaytambo um caminho mais curto. Logo ao lado desse maravilhoso quarteto estava eu e a Eriquinha, finalizando a tripulação dessa louca viagem. Sentado como quem não quer nada, apenas observando o trem cruzando os impressionantes gigantes de pedras e margeando o rio com o mesmo nome da cidade de onde partimos, entrava eu em profundo devaneio, uma espécie de efervescência e calma que tomava ao mesmo tempo meu espírito. Já começava a escurecer e o sol poente se escondia atrás
dos Andes, seu crepúsculo anunciava que partia, mas retornaria ainda mais belo no dia seguinte. Meus olhos, naquele momento, avistavam apenas uma imensa penumbra. 
Eram os últimos momentos daquele maravilhoso dia. Nesse estante lembrei-me de meu fiel companheiro de viagem – Diário de bordo – que havia carregado com tanto zelo nessa excursão. Vale contar ao leitor que esse diário era um presente que ganhei de minha adorável namorada Erica meses antes dessa grande viagem. Tinha ela feito um belo trabalho de recorte e colagem decorando o caderno com fotos de lugares que passamos e ainda iríamos atravessar no transcorrer dessa jornada. Decidi então abrir meu diário e escrever algumas palavras que ainda restavam em minha memória sobre a famosa cidade de Machu Pichu.


MACHU PICHU: A CIDADE PERDIDA
No dia passado havíamos então chegado à cidade Inca, perdida por tempos aos olhos dos conquistadores espanhóis. O nosso guia e amigo de viagem Simba bem explicou que séculos depois da conquista espanhola sobre aqueles países andinos, o curioso pesquisador Norte-Americano Hiram Binguam com ajuda de nativos locais havia finalmente localizado as ruínas no altiplano peruano. Um ano após essa surpreendente descoberta esse pesquisador conseguiu fundos para pesquisas nessa área. Foi então em 1911, após quase 400 anos obscura aos olhos do mundo, que a cidadela de pedra começou a ser escavada e documentada em uma épica edição da revista National Geographic. Realmente os antigos construtores Incas souberam ocultar essa maravilha sagrada aos olhos dos estrangeiros. Não contavam eles em sua época com a ganância de alguns homens locais conhecidos também por “vaqueiros” que por anos saquearam os tesouros daquela antiga civilização.
Após esse longo período de grandes descobertas, escavações magníficas, documentações precisas e construções de museus para acolher algumas das peças mais importantes, a velha cidade passou a despertar curiosidade aos turistas, principalmente por sua beleza, engenharia e construções enigmáticas. A cidade é toda espetacular, ainda na trilha Inca a alguns quilômetros do local é quase impossível avistá-la por inteiro. O nevoeiro e seu eterno vai e vem mostra realmente que a cidade foi construída sobre as nuvens. Só quando você está lá, dentro da cidade é que se da conta que realmente entrou em Machu Pichu. Hoje a cidade recebe visitas de milhares de turistas vindos do mundo inteiro a fim de viver essa experiência inacreditável. 

CONHECENDO A CIDADE
Dentro da cidade logo se percebe que ela foi construída sobre o cume de uma montanha, cercada por tantas outras. Então não é difícil de perceber que fora do perímetro urbano encontram os imensos precipícios. Daí se entende a dificuldade de achar essa cidade no transcorrer do tempo. As construções são todas magníficas, dotadas de uma engenharia ainda hoje insuperável. Na área nobre da cidade onde se localizam os templos e as moradas da nobreza impressiona-se ainda mais com as construções. Parecia, a meus olhos, que eles brincavam com os imensos blocos de pedras trabalhados. Havia, me lembro bem, o templo do Sol, não era muito grande em tamanho, mas sua beleza era magistral. Havia a grande porta de pedra que dava inicio a caminhada do templo. As pedras que compunham aquela magnífica construção eram todas encaixadas perfeitamente, pedra sobre pedra. Não havia como passar um fio de cabelo se quer sobre o vão que separava as rochas. Subindo sobre o templo e indo em direção ao observatório, a área mais alta da cidade, a vista era perfeita, me sentia totalmente entre as montanhas que compõem a cordilheira e observei que logo a minha frente havia um corte entre elas e o inicio de uma grande planície. Os incas como exímios construtores fizeram nessa área mais alta uma maquete dessa vista magnífica em um único bloco de pedra. Perfeita também era uma pedra encravada no chão que apontava os quatro pontos cardeais. Nessa oportunidade o guia nos explicou que o ponto sul e norte eram os maiores dos pontos cardeais, pois foram onde os Incas avançaram mais com sua civilização, chegando ao norte no território onde hoje é a Colômbia e ao sul na Argentina e Chile. O ponto oeste era um pouco menor e dizia o guia que se direcionava ao Pacifico. Finalmente o ponto leste, o menor de todos ia em direção a floresta Amazônica onde os Incas não avançaram por conta das doenças tropicais. Para concluir os incas moldaram essa rocha de uma forma que em determinadas épocas do ano ela projetasse sobre o solo a figura da cabeça de uma ilhama, animal símbolo da cultura Inca que impulsionou o seu avanço sobre esses extensos territórios.

OS INCAS E OS INCAPAZES
Lembro também que em um local mais abaixo do observatório havia um conjunto de pedras semi trabalhadas que pareciam algo experimental. Esclareceu novamente o guia que àqueles imensos blocos de rochas eram “restos” que os construtores deixaram para trás, pois, provavelmente não seriam mais utilizáveis na construção da cidade. Os pesquisadores atuais resolveram então solucionar o mistério da engenharia Inca sobre aqueles blocos. Alguns tinham furos onde os estudiosos injetaram toras de madeira. Logo após a inserção da madeira, molhavam essas toras para que seu volume aumentasse. Esse processo aparentemente simples fazia com que a rocha se rompesse. Por algum motivo elas se rompiam irregularmente e nem de longe pareciam às maravilhosas pedras confeccionadas pelos Incas. Só a titulo de curiosidade 70% da cidade de Machu Pichu contem sua estrutura original feita pelos Incas. Os outros 30% foram restaurados por pesquisadores, que com essa técnica grosseiramente narrada por mim foram chamados de Inca (pazes) por não apresentarem o mesmo método apurado dos antigos construtores.

O “PUEBLO”
Mas o que realmente me chamou a atenção foi à parte popular da cidade, o chamado “pueblo”. Viviam eles (o povo inca) no passado como nós em suas casas, de pedra é claro, separadas por cômodos a milhares de metros de altura. Como era de se esperar a segregação social já se fazia presente também nessa cultura. A área nobre da cidade era separada da área popular por imensos terraços centrais. Suas casas eram construídas mais grosseiramente, o lascamento da pedra não era trabalhado como nos templos. Por conta disso eles necessitavam de uma argamassa para dar encaixe às lascas de pedra. Sentia-me em um labirinto caminhando por aquele antigo e desabitado bairro popular. Os únicos moradores eram as Alpacas e Ilhamas que viviam soltas naquele local, atestando hoje os resquícios da antiga vida na cidade. Provavelmente como hoje, elas viviam pastando naqueles sítios e eram criadas com zelo pelos antigos moradores, pois além de fornecerem a carne essencial naquela altitude também davam a lã para se aquecerem contra o frio. As escadarias levavam-me de uma parte a outra, horas ficava perdido, horas achava que estava sempre no mesmo lugar, a mim pareciam casinhas feitas pela CDHU. Esplendido era retornar, mesmo que sem alguns detalhes, para a vida cotidiana do povo que com raça construiu e deu vida a aquela cidade que o mundo hoje passou a admirar.
Caixa de texto: LOS ANDES
Fechei meu diário de bordo com uma estranha sensação. Havia escrito minhas lembranças recentes, mas me parecia que ainda tinha muito a ser dito. No entanto essa sensação não era de se estranhar, havia percorrido um longo caminho até a cidade perdida, chegando a ela entrei de braços abertos a todo tipo de emoção e elas me invadiram o coração sem licença. Não seriam em simples palavras, fruto de lembranças imperfeitas que elas seriam aqui descritas. 

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